Edson era um desses seguranças da Alfa (aqui em Moçambique há um segurança por porta de casa e prédio nas zonas classe média e 90% são dessa empresa). Fardado e sério tem cara de perigoso, mas quando aqueles 20cm de sorriso com dentição completa e branca, deixa claros os seus 25 anos e a simpatia herdada. Gostava de conversar com os “patrões” mas nunca puxava papo. Esperava o approach e pouco a pouco ia se soltando.
Numa dessas conversas revelou que seu pai se casaria e convidou o mulungo a participar. “Claro, claro!” e nada mais foi dito por uma semana. Até que Edson saiu de casa um dia com uma cópia do convite feito por ele próprio. Disse ao patrão “espera só um minutinho que já trago uma coisa pro senhor”. E voltou com o convite embrulhado em um papel de revista. Uma produção computadorística simples mas feita com carinho. Era um cartão postal com uma imagem de dois bonequinhos brancos de mãos dadas, com os dizeres “Maria de Fátima e Adriano Mabote convidam”. Tudo isso fora de centro, impresso na parte superior do cartão, com vários centimetros em branco na parte de baixo.
O mulungo cheio de orgulho da sua nova amizade moçambicana foi logo contar à namorada. Foi só no terceiro dia após o convite que revelou-se a verdade nua e crua... ele estava sendo tramado para desfilar sua limusine de mafioso libanês com os noivos: os pais do Edson.1 – Mata-bicho (café-da-manhã) na casa do noivo
2 – Palácio dos Casamentos – casamento civil
3 – Jardim dos Namorados – fotos
4 – Igreja – cerimônia religiosa
5 – Copo d’água na casa da noiva (de água, nada)
6 – Festa na igreja
7 – Festa principal na casa do noivo, com entrega de presentes
Os dois últimos itens acontecem no domingo.
Os mulungos são convidados a mata-bichar, apesar de já terem comido em casa, receosos de passar fome. A primeira gafe. De barriga cheia, engolir às 08:00h da manhã um pedaço de galinha temperada e um copo de chá fraco sem açucar... As dez pessoas presentes já começaram a rir-se de nós a partir desse momento. Sêo Adriano não. Sempre com um sorrisão demonstrando respeito e alegria de ter-nos por perto.
Na saída ouvimos pela primeira vez o grito de alegria das mulheres moçambicanas. O som parece um pouco ao emitido pelos nossos indígenas, mas elas fazem a interrupção entre os sons com a língua e não com a mão, produzindo um “lululululu” em coro, agudo e alto. A madrinha ia na frente limpando o caminho com um espanador de folha de coqueiro, e o resto se organizava em forma de procissão com o Sêo Adriano radiante na frente. Entram no carro, e os mulungos dirigem.

Chegando ao Palácio dos Casamentos, uma surpresa. Achamos que haveria só o casamento dele pelo período de uma hora... eram dezenas, com centenas de pessoas a espera, 8 noivas na fila das cerimônias atrasadas. 15 minutos cada casamento.
Só negros. Não que em Moçambique só haja negros. Os indianos, árabes e brancos têm sua própria tradição. No Palácio, só negros. Com direito a danças típicas, cantos em coro e lenços na cabeça. Assim todos se (des)organizavam esperando sua vez.
Por: Luís Paulo R. Camisasca. Inverno de Maputo, 2007.

5 comentários:
What a way with words you have. Brings it all to life.
Vai fundo.
Brada
Enquanto não chegar aos 3 comentários não publico o próximo episódio. humpf!
LP
cara, muito legal a cerimônica, os cantos...
cada experiência hein meu amigo.
vaya!
Lu, adorei a foto da mãe com a filhinha "embrulhada" na rede. Eu não teria coragem de colocá-la nas costas, a criança fica muito esposta!! Minha cara fazer esse comentário.
fafá, acho q a capulana é um jeito mto legal de cuidar dos bebês. eles ficam sempre com o calor da mae, acompanhando cada passo dela.
as vezes vejo a irma mais velha da familia levando o mais novo. lembro mto de vc.
beijos
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